domingo, 31 de maio de 2009

A CLAVINA “SPENCER”



ARROYO AQUIDABAN, CONCEPCIÓN, PARAGUAI, 01 DE MARÇO DE 1870...
“Os soldados brasileiros cercaram o comboio do General Lopez e deram ordem de parada e rendição”. Panchito Lopez, um dos filhos dos Reis Paraguaios não se rendeu, respondendo à soldadesca aliada que um soldado paraguaio não se rende – Madame Lynch, gritou da carruagem “entrega-te Panchito”, mas o herdeiro do trono paraguaio respondeu “não, não me entregarei a esses macacos”, referindo-se a cor negra da maioria dos nossos soldados, negros libertos, alguns alforriados, quando um valente brasileiro da tropa de Duque de Caxias, retrucou e ordenou a rendição de Pancho, ecoando na floresta o alerta: “já mandei parar, seu filho da puta”...Segundo a história e versões desse mundão o "cabo Chico Diabo" descumpriu ordens superiores e liquidou o “Mariscal” Francisco Solano Lopez com um certeiro golpe de lança na virilha. Muitos, entretanto, consideram que um outro soldado brasileiro, desfechou um tiro mortal de revólver para liquidar completamente Lopez calando de vez a epopéia e os sonhos paraguaios. Algumas versões dão conta que, ao matar o Rei, Chico tinha como objetivo uma recompensa de cem libras de ouro para matá-lo, mas se sabe que essa recompensa veio com o pagamento de cem vaquilhonas, aquelas vacas virgens que não deram cria. Tomou como botim do homem tombado, a faca com cabo e guarnições de prata e ouro que o Marechal levava quando foi morto e na qual constavam, gravadas em ouro, as iniciais "FL" (Francisco Lopez) coincidentemente as mesmas do nome de Chico (Francisco Laceda) (FL) tornando-se um mito naquela guerra sangrenta, um Marechal liquidado por um Cabo voluntário, sem qualquer treinamento nas fileiras regulares do exército. A lança usada pelo militar brasileiro no episódio encontra-se no MUSEU HISTÓRICO NACIONAL, RJ e é interessante recordar que naqueles idos uma cantiga brasileira se referiu ao massacre com os versos “O Cabo Chico Diabo, do diabo Chico deu cabo". O soldado brasileiro e autor do tiro de misericórdia em Lopez, foi alvejado por Panchito Lopez, mas o Exército Brasileiro respondeu com fogo pesado e liquidou o menino de 16 anos. Elisa, vestida e protegida pela bandeira do Reino Unido, foi preservada e cercada de enigmas, lendas folclóricas, ganhando ingredientes sensuais na atualidade, mas há impressões negras nessa história, com o despertar da biografia de Madame Lynch.”



COMO A HISTÓRIA “É"
O que a introdução tem a haver com a Carabina “Spencer”? Siga meu raciocínio. Pelo fato de ser “voz comum”, entre nós colecionadores, atiradores e amantes das peças clássicas brasileiras, que o “Mariscal” Solano Lopez, foi “abatido” por um tiro de uma Clavina (carabina) “Spencer”. Esse texto, descrevendo os últimos momentos do “Mariscal”, encontrada nos livros lá no museo de Guaíra e tão bem relatada pelo historiador Zuza Barão, coloca um pouco mais de pimenta nas “conversas” quando nos reunimos. É importante? Tenho que “uma outra versão” é sempre bem vinda para nosso enriquecimento cultural , principalmente, se tivermos em mente que o teste que iremos “vivenciar” nas próximas páginas tem sua história originada de uma encomenda de 2.000 peças importadas, pelo EXÉRCITO BRASILEIRO para fazer parte da Guerra contra o Paraguai, lá pelos idos de 1868, dos Estados Unidos da América. Vamos trazer aos nossos dias a “magia” de uma dessas excepcionais peças, que participaram ativamente de nossas batalhas. Antes da experiência em atirar com a Carabina “Spencer”, permitem-me uma provocação?



Em um reunião com os amigos, faça um pequeno teste. Lance a seguinte afirmativa, - Na guerra do Paraguai...(blá,blá,blá...)! Quase que por encanto “d’outro” lado da sala, vem a definição: - Não é guerra “do” Paraguai. É Guerra “contra” o Paraguai! Como? Você argumenta que a substituição de “do” por “contra” é uma simples firula mas, se fosse “do” Paraguai, seria na pior das hipóteses, dentro do território paraguaio e foi, pelo menos geográficamente falando, em um pedaço da região do Rio da Prata, que além do Brasil, compreendia a Argentina, o Paraguai e o Uruguai, concorda? Na sequência... Vamos a outro exemplo?
Em março deste ano (2009), estará fazendo 139 anos do término do confrontou das tropas brasileiras com o “Mariscal” Lopes. Sim, cento e trinta e nove anos! Assim mesmo, o assunto “Guerra contra o Paraguai” causa um certo “frisson” entre nós brasileiros. Recentemente, deve ter sido lá pelo final de 2006, se não me falha a memória, surgiu uma linha do “segmento intelectualizado brasileiro”, que afirmava a necessidade de “repaginarmos” (para usar um termo “in”) nossas fronteiras com o Paraguai no sentido de devolvermos, aos vizinhos, uma nova linha de nossa fronteira, com um pedido de desculpas e com cento e trinta e nove anos de atraso, provavelmente! Uma outra linha, ponderada talvez, contestou categoricamente. Lembram, disso? Então...
Quer tenham sido, por questões econômicas, comerciais, fronteriças e até, por uma delicada relação diplomática, nossos antepassados se meteram em um conflito, sem precedentes na América do Sul., Desse atrito destrutivo, tivemos um verdadeiro salto evolutivo nas novidades tecnológicas do século XIX. Lembrem-se que os efeitos da Guerra da Secessão, nos Estados Unidos (1861/1865), credenciou esse país a exportar tecnologia de artefatos bélicos, sendo que esse foi um dos motivos pelos quais em 1868, o Brasil ter importado 2000 clavinas do modelo “Spencer”, com capacidade de 7 cartuchos, para participar no final da guerra.
Agora, centro e trinta e nove anos depois, pelas páginas da MAGNUM, podemos desfrutar da sensação de “atirar” com uma Carabina “Spencer”, cujos “antepassados” estrearam na Guerra contra o Paraguai.



A peça que levo ao Clube Piratininga para atirar é de origem Belga. Na hora, você pensa... mas, você não acabou de escrever que vieram dos EUA?... Calma, explico! As 2000 peças a que me refiro foram importadas dos EUA e, após a estréia (1868) se seguiram vários outros pedidos, mas a empresa americana – Fogerty Rifle Company - faliu em 1869. A partir dessa data os pedidos eram fornecidos pela Bélgica, por um problema de direitos de fabricação. É oportuno abrir um parêntesis aqui. Se desejar os detalhes da origem e amadurecimento das Carabinas “Spencers” na história brasileira sugiro uma ótima “navegada” pelos sites que destaco lá no final da matéria. Se desejarem, escrevam para a MAGNUM que terei prazer em lhes enviar o acesso pela internet. Voces ficarão boquiabertos com a quantidade de informações que existem sobre as armas brasileiras, bem como o que os “experts” escrevem. Fechando o parêntesis e voltando para a “Spencer”, ela foi fabricada após 1893 pela Tailleur F, marca registrada em 1869, no calibre 56-50 (12,7 mm). Marcas de prova, de formato triangular, em várias partes da arma, com as iniciais FT. Infelizmente, as inscrições estão pouco visíveis, o que demonstra uma boa utilização da peça. Mas isso não importa, só requer mais cuidado para atirar, certo?
Nunca é demais lembrar que quando estivermos tratando uma arma com uma idade avançada, todo cuidado é pouco. Se você leitor possuir uma e desejar atirar, não fique com uma só avaliação - se pode atirar ou não! Chame algumas pessoas, principalmente, do clube a que pertença. Sempre ouça outra opinião, essa atitude pode inibir uma tragédia, pelo menos é que o desejamos para nosso divertimento, não é? Pergunte, questione, duvide, analise as informações coletadas, folheie os artigos na MAGNUM, telefone, escreva uma carta, envie “e-mail”, mande um SMS, um torpedo, não importa o canal de comunicação, não fique nem faça as coisas sozinho, compartilhe...comunique-se!







PREPARE O MATERIAL
Atirar com uma peça dessas é super simples e muito prazeiroso, embora requeira alguns cuidados. Primeiro vamos fazer uma lista de materiais que iremos necessitar. Como em uma receita culinária vamos iniciar por escolher os ingredientes (adoro imaginar que sou o Alex Atalla do tiro!)
◊ Pólvora (propelente para os mais avançados)
A “negra” e da Imbel (muito cuidado em não fumar próximo ao material, os que o fizeram, práticamente, não seguiram para a leitura da próxima etapa...);



◊ Ponta (projétil para os entendidos)
Em minha pesquisa, encontrei uma com peso (massa para os entendidos) de 340 grains. As originais americanas eram de 375 grains. Me considero um cara de sorte em ter encontrado a de 340 grains, fundida em chumbo puro, bem característica da época, em perfil de ponta “flat”. Minha ponta, pela foto, tem duas canaletas e a graxa que utilizei é própria para atirar com pólvora negra;
◊ Espoleta
Sem medo de ser feliz, usei a CBC, 9 ½ (large rifle);
◊ Painço (uma homenagem ao meu amigo Flávio Duprat – o Urso)
Para preencher o “espaço” entre a pólvora e a base da ponta, dessa forma a pólvora não fica “solta” e permite um desvio padrão, entre as médias das velocidades de tiro bem próximas. Lembram, quando o professor de estatística, escrevia na lousa que a dispersão entre os pontos médios deveria tender a 1? E, quanto mais próximo a esse valor, melhor seriam os números médios coletados? E nós pensávamos quando é que iriamos utilizar isso? Surpresa! O momento chegou! Saibam que, quanto menor o número do desvio padrão melhor é a qualidade dos numeros médios obtidos;



◊ Estojo (não chame de cápsula. Cápsula é a pílula de vida do Dr. Ross ou então a Apollo 11.)
Uma senhora experiência! A minha dúvida se resumia em: - Por onde devo começar? Pelo início, que é o mais simples! Pesquisei o tamanho original do cartucho em livro específico, para depois sair a campo e descobrir o que existia no mercado brasileiro, para adaptar. Muito bater de pernas e indagações para descobrir que o estojo calibre 32, de latão da linha Presidente CBC, é o mais próximo do 56-50. Corta na altura, “passa” pelo “die” do 56-50, faz um anel para segurar a espoleta e pronto, tenho o cartucho para utilizar na Carabina “Spencer”. Admito que lendo a descrição acima, é muito mais fácil do que fazer. Primeiro, encontrar o “die” que possa ser utilizado é tarefa complicada e exaustiva. Ajustar o bolso da espoleta do cartucho para encaixar a espoleta da CBC é projeto de relojoeiro suisso. Sobra cortar o latão na altura necessária. Isso tomou-me pelo menos um mês, sempre nos finais de semana.
Prezado leitor, seja sincero comigo, vendo a foto dos projéteis ficou um bom trabalho,”né”? Funciona? Não tinha a menor idéia quando fiz as fotos, mas que ficou legal, ficou!



PREPARE A CARGA
A parte mais delicada para determinar se a “arma” tem condição de tiro é saber com quanto carregar o cartucho. Qual a carga a ser utilizada? Que é pólvora negra já sabemos, mas qual o peso? Quantos “grains”? (medida americana para determinar o peso da pólvora, 1 grain = 0,0648g). A internet é ótima para isso também. No site sobre as “Spencers”, cuja referência faço no final do artigo, encontrei as seguintes dicas: para atirar com uma Carabina de 20” de cano, com um projétil de 370 “grains”, obtendo uma velocidade média de 900 fps (pés por segundo) a carga padrão de pólvora negra é de 35 “grains“. Pronto, é só seguir a “receita” e vamos atirar... Espere só um pouquinho! Vamos seguir sim, a receita porém com uma certa segurança, ok?



Minha sugestão é construir uma graduação de segurança. Iniciei a carga com 25“grains” e montei 4 cartuchos com essa carga. Fiz a mesma coisa com 29, 33, 35, 37 e 40 “grains”. Você pensou, por que 4 cartuchos, não é? Três para medir a velocidade no cronógrafo e o quarto por segurança. Vai que o cronógrafo não “detecta” a velocidade ou se uma espoleta falha (ou o percursor não detona a espoleta), lembre-se segurança é também segurança nos dados a serem coletados, principalmente, se for escrever um artigo.
Você pode me perguntar também, de onde tirei a escala de números (29, 33, 35, 37 e 40 “grains”). Respondo-lhe que usei bom senso e experiência. Na internet está claro que a base é 35 “grains”. Como nunca atirei com essa peça e não desejo estragar nada, resolvi descer dois degraus da base (35 “grains”, certo?) para analisar o comportamento na hora do disparo. Verifico a velocidade com 29 “grains”! A espoleta não “chapou”, o estojo não apresenta nenhum “stress”, continuo o teste. Pulo para os cartuchos carregados com 33 “grains”, refaço o procedimento, mostro para colegas, comento, analiso, pondero, anoto os números, me comunico...
Finalmente construi a seguinte tabela com os dados obtidos:
Carga (grains) Média de 3 Tiros (ffs) Desvio Padrão
..........29...........753..................26
..........33...........786..................31
..........35...........859..................13
..........37...........865..................55
..........40...........952..................14
Deixe-me comentar a razão pela qual escolhi a carga de 35 “grains”! Embora tenha obtido uma velocidade menor (859 ffs) que a perquisada (900 ffs) lá na internet, os cartuchos com a carga de 40 “grains” apresentaram um certo “suor” após o tiro e, por princípio, algo que “chore” não é bom. Optei pelo 35! Opa! Por que não o de 37 “grains”? Dê uma olhada no desvio padrão da carga de 37. Está mais distante do número 1 que a carga de 35 “grains” e, pela definição já comentada, fico com a carga de 35 “grains”,concordam?



ADMIRE O ALVO
Este é o melhor momento de toda a nossa aventura! Até então procurar pelo material a ser utilizado, acertar a carga mais parecida com a usada há 120 anos atrás, mecanismo da peça, ajuste da mira é tudo muito gostoso de fazer, porém o resultado final, o tiro um após o outro, aquela nuvem de fumaça de pólvora preta, os amigos comentando o resultado, isso tudo é impagável. Você consegue se abstrair de qualquer problema que tenha que resolver nas próximas duas horas.
Cheguei no Clube Piratininga lá pelas 10:00 horas em um domingo com céu coberto. Fazia uns 26 graus e estava bem abafado, como todo mês de dezembro. Comprimentei todos, como de costume, fui para o “box de tiro” onde, normamente, utilizamos para testar a velocidade dos tiros. Meu objetivo era avaliar a cadência da carga com sete tiros e o respectivo agrupamento. Foi só desembrulhar o fusil para constatar que o “aroma atraia a abelha”. Chega o primeiro curioso com a pergunta: que tipo de puma é essa? (com certeza estava se referindo a um rifle Rossi, 38 especial) Resolveu então olhar com mais atenção e solta: Que raio de arma é essa, nunca ví... Outros dois sócios que estavam presenciando a cena de longe começam a caminhar na minha direção. Puxa, é uma “Spencer”! Eu ví aquele filme do Clint Eastwood em que...( penso no “Unforgiven” – Os Imperdoáveis), fico escutando, ”né”? Vou fazer o que? O grupo começa a aumentar. Essa arma não foi usada na Guerra “do” Paraguai? Na hora me lembrei do cara fazendo o teste com seus amigos, é “contra” não “do”... Resolvi ficar quieto e...escutar. Alguem deve ter lido minha mente e me ajudou a dispersar a “convenção” com umas simples palavras: Pô, vamos deixar o cara atirar, gente? Agradeço de coração a esse psicólogo de multidões, dessa forma pude continuar meu objetivo.
Apoiei a Carabina “Spencer” em sacos de areia e deixei a coronha bem fixa no meu ombro. Já estava carregada com as 7 “balas” (desculpe Hélio Barreiros, quis dizer cartuchos. Quando estiverem com meu amigo, solicitem que lhes contem sobre a história da bala ser chamada de cartucho e vice-versa, vale a pena!). Consegui chegar até o quinto tiro em uma cadência, que se tivesse completado teria comprovado a afirmação que a Carabina “Spencer” possui uma capacidade entre 12 a 21 tiros por minuto. Este intervalo significa que você pode dar um tiro a cada 5 segundos, se for lento e respeitar os 12 tiros. Se for um pouco mais ágil e treinado pode dar um tiro a cada 3 segundos, no caso dos 21 tiros. Minha média estava em 4 segundos, tinha completado 20 segundos e dado 5 tiros, só que a conversa nas minhas costas tirou minha concentração, consequentemente meu teste. Sou obrigado a fazer uma regra de três para concluir o resultado. Por que? Muita fumaça branca, muita conversa sobre o tiro grosso, tiro alto, tiro baixo, tiro dentro da bola preta, fora da bola preta, arma de 120 anos, construção que não se faz mais, torneiro mecânico, armeiro, historiador, contador, palpiteiro, resumindo, se desejar fazer um teste, qualquer que seja ele, faça-o no dia que o clube fechar, aí sim é a melhor data.
Fiz isso e o resultado apresento na fotografia do alvo com um belo agrupamento considerando todas as variáveis como idade da peça, dificuldade na obtenção do material para o teste e até nas conversas paralelas dos “amigos” que, se não fossem por eles do que valeria toda essa nossa estória? É isso, até a próxima...
Façam uma experiência em casa. Atirem com pólvora negra e não lavem a peça por uma semana, só uma semana! Se desejarem peças como as da fotos



CURIOSIDADES CRONOLÓGICAS
11 nov. 1864 Declaração de guerra do Paraguai contra o Brasil.
10 jan. 1865 Batalhão de voluntários parte para o Paraguai.
05 mar. 1865 Paraguai declara guerra à Argentina.
01 mai. 1865 Assinado tratado da Tríplice Aliança (Brasil, Argentina, Uruguai) contra o Paraguai.
11 jun. 1865 Batalha do Riachuelo.
05 ago. 1865 Invasão das tropas paraguaias à província do Rio Grande do Sul.
19 ago. 1865 Alistamento de Castro Alves no Batalhão Acadêmico de Voluntários.
24 jun. 1867 Primeira operação militar aérea (c/ balão) brasileira na guerra contra o Paraguai.
30 dez. 1868 Marques de Caxias sai do Rio e vai para o Paraguai (chega em 05/01/1869).
01 mar. 1870 Morte de Solano Lopes e Panchito.
30 nov. 1870 Ordenação de Cícero Romão Batista – Padre Cícero.
28 set. 1871 Lei do Ventre Livre.
09 jan. 1872 Assinatura do Tratado Definitivo de Paz e Amizade Perpétua entre Brasil e Paraguai.






Fonte de dados:
Aspectos “logísticos” da Guerra do Paraguai – 1864-1870 de Braz Batista Vas (Doutorando do Programa de Pós-Graduação em História da UFT – Universidade Federal de Tocantins)
A RAINHA DO PARAGUAY RECORDAÇÕES DA VIAGEM A GUAÍRA a sedutora Elisa Alicia Lynch - Zuza Barão, fevereiro de 2007, São Paulo http://www.famiglia.barone.nom.br/index91.htm
Armas Brasil – Clavina Spencer http://www.francisco.paula.nom.br/armas
The Spencer Rifle – Technical Assessment http://www.awod.com/gallery/probono/ewchas/spencer.html
The Handloader’s – Manual of Cartridge Conversions – John J. Donnelly & Bryce Towsley – Third Edition
Spencer Repeating Rifle Company – 1866 Navy Rifle, Army Rifle, Large Carbine, Small Carbine, Sporting Rifle.
Armory, Tremont Street, Boston, Mass.
Consulte! Vale a pena:
http://www.sobresites.com/alexcastro/artigos/pessoal.htm
Maravilhoso artigo de Alex Castro onde expõe sua visão sobre a Guerra do Paraguai (IMPERDÍVEL).
http://www.sobresites.com/alexcastro/artigos/riachuelo.htm
Riachuelo:Dia D do Brasil - Alex Castro (você jamais será o mesmo depois dessa leitura).
Jornal Folha de São Paulo, Caderno Ciências, de 24 de agosto de 2008 – Guerra do Paraguai trouxe avanços para a medicina, artigo de Ricardo Bonalume Neto.

FICHA TÉCNICA - Carabina “Spencer”
calibre: 56-50 (12,7 mm)
Comprimento: 94 cm
Peso: 3,8 kg
Raias: 3 ou 6 à direita
Alcance útil: 300 m
Alça de mira: de 0 a 900 jardas
Cadência de fogo: 12 a 21 tiros por min.
Carregador: 7 cartuchos
Velocidade inicial: 900 f/s

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Comblain



Hubert Joseph Comblain era um armeiro e inventor na cidade de Liége, Bélgica. “Pai” do COMBLAIN, arma adotada pelo Brasil, no período de 1873 até meados da década de trinta do século vinte. Logo após aquilo que nós brasileiros chamamos de Guerra do Paraguai uma comissão do Exército Brasileira aprovou três grandes modelos, o COMBLAIN (do exército belga), o Martini-Henry e o Wesley-Richards mod. 2 (do exército da Grã-Bretanha). Os outros participantes eram o Remington mod. 1867, o Chassepot mod. 1866 (do Exército Francês) e o Mauser mod. 1871 (do Exército Alemão). Após os testes foi elaborada a compra de 3.000 fuzis e 2.500 carabinas COMBLAIN, isso em 1872.
Estima-se que o Brasil tenha adquirido por volta de 50.000 peças até meados de 1893, quando a Comissão de Melhoramentos do Exército Brasileiro decidiu por introduzir o Mauser modelo espanhol. Até a rebelião de Canudos (1896) nós podemos contar com 6 (seis) modificações no COMBLAIN tendo sido utilizada a designação: Nº1 ou M73 (1873), o Nº2 ou M74 (1874), o Nº3 ou M78 (1878), o Nº4 ou M85 (1885), o Nº5 ou M89 (1889) e o Nº6 ou M91 (1891). Com exceção do Nº5 ou M89 que era no calibre 11x53R, os outros eram todos no calibre 11x50R.
Eu tenho muito prazer em atirar! Deixe-me explicar antes que alguém taxe, minha atitude como politicamente errada e, caso o façam, que pelo menos a fundamentem.
O ato de atirar não é só o suave e contínuo apertar de um pedaço de aço (gatilho) que irá deslocar uma peça em formato de martelo que transporta ou aciona um pino (cão), em direção a uma espoleta, gerando uma reação química que deslocará um pedaço de chumbo por um cano, com uma incrível velocidade e rotação, em direção a um alvo móvel ou imóvel. Dessa somatória de ações, ocorrida em milésimos de segundos, obterei um resultado que mostrará se estou preparado para uma segunda oportunidade (de atirar de novo) ou, se o meu destino é à frente de uma tela de televisão.
Pelos anos que estou neste segmento do Tiro Esportivo, fico mais tempo com meu “hobby” do que com minha televisão. E espero ficar muito mais tempo ainda junto ao meu grande prazer, que é atirar.
Antes que digam que isto está parecendo mais uma declaração de amor do que um depoimento sobre o que me ocorreu, recentemente, vamos ao que interessa. Tudo começou em um belo domingo ensolarado quando, enquanto limpava meu fuzil COMBLAIN, fiquei imaginando que não tinha atirado ainda com aquela peça. Terminei minha tarefa e, rapidamente, iniciei a elaboração de um plano para experimentar o COMBLAIN. Não existe plano sem lápis e papel.

Logo, quando tudo estava a postos comecei por:
a)Encontrar literatura especializada sobre a utilização do calibre – 11X50R. Desejo aqui abrir um parêntese. Se algum dia você quiser saber, qualquer coisa sobre qualquer calibre que você não tem a menor idéia do que seja, sugiro um telefonema ou um contato com o Dr. Crezo Zanota. Você irá descobrir tudo e mais um pouco sobre o calibre pesquisado. Obrigado, doutor!
b)Verificar se em sua relação de amigos eles possuem, os “dies” (ferramentas necessárias à recarga) do calibre pesquisado. Quem pode fundir os projéteis não podendo se esquecer de calibrá-las na medida correta do cano. Vale a pena fazer uma ressalva aqui. Existe uma matéria do Dr. Creso, na Magnum nº100, página 10 que ensina a fazer a medição do cano. Voltando! Qual o peso e forma do projétil? Respeite sempre, na medida do possível, a originalidade do projeto
c)Um item importante. Qual pólvora usar e em que quantidade! Pólvora Negra ou pólvora sem fumaça? Minha sugestão, para facilitar seu caminho, é que conte com a experiência dos colegas de Tiro. Vale aqui também uma pequena propaganda. Se você for sócio, de um bom Clube de Tiro, daqui de São Paulo – SP, é simplesmente o máximo. Sem contar o fato de que lá, fui presidente, por duas vezes. Deixando de lado o pequeno detalhe de que fui presidente do “Pira”, como carinhosamente o chamam seus sócios, e isso poderia me fazer um tanto exagerado ao declarar meu amor pelo clube, o fato é que, numa empreitada como essa, ter colegas com quem dividir as idéias, preocupações e, principalmente, o sucesso, é extremamente agradável.
d)Selecionar um cronômetro para medir o resultado do teste é fundamental. Máquina de calcular, planilha feita no Excel, pois gráficos vão facilitar seu entendimento no momento da conclusão. Eu só não sugiro uma apresentação com o “Powerpoint”, senão seus amigos vão pensar que você está maluco, porque achar, eu tenho certeza, eles já acham...

Imaginava o Leitor que era só colocar um cartucho já montado no fuzil e atirar? Caso isso tenha passado pela sua cabeça, pare de ler! Vire a página! Procure por outro artigo! Vá tomar um café expresso! Eu avisei que gostava muito de atirar e toda essa preparação faz parte do ato de “atirar”. Muitas vezes, vale mais do que, simplesmente, “puxar o gatilho”.
A pesquisa, os fatos, as datas, os lugares, tudo isso está agregado ao ato de atirar. Você pode encontrar pesquisando pela nossa historia, descrição de uma peça parecida com a sua isso proporciona uma satisfação impagável.
No meu caso, chego a imaginar uma reunião, lá pelos idos de 1896, entre Antonio Conselheiro e seus colegas de rebelião. Noite quente, ao redor de lampiões de querosene, confabulando como resistir às tropas Federais que estavam por chegar. E, nessa mesma sala, pelas paredes esburacadas por tiros, estão enfileirados alguns fuzis “COMBLAIN”, prontos para defender os ideais daquele levante. Se estivessem certos ou errados isso pertence à outra estória.
Estava eu, afinal, pronto para testar o fuzil “COMBLAIN”. Arranjei alguns estojos vazios, garimpados pelo interior deste país, no comprimento de 1.984” de polegada ou 50 mm. As espoletas são 9 ½ da CBC “Large Rifle”. Os projéteis foram fundidos e lubrificados engraxadas a partir de um molde do calibre 43 “Spanish”, com o peso de 375 ‘grains’ e com diâmetro externo de 0.430” ou seja, o mais próximo do cano do rifle (medido em 0.448”). Quanto ao propelente, optei por iniciar os testes com a pólvora negra fornecida pela Imbel e, como primeira carga ou tiro experimental, utilizar 45 “grains”. Como cheguei a este valor? Peguei, em primeiro lugar, um estojo vazio. Ajustei o projétil na altura desejada (canal do ‘crimp’), dentro do estojo e medi a altura do espaço restante. Na seqüência, adicionei a pólvora, até que ela se ajustasse rente à base do projétil. Removi o projétil e pesei o conteúdo da pólvora. Deu 68 “grains”. Isto significa que se fossemos atirar com carga plena devemos colocar 68 “grains” de pólvora negra. Como o objetivo é fazer um teste em segurança, vamos iniciar com 33 % a menos ou seja, utilizar 45 ‘grains’. Para que a pólvora não fique “jogando” dentro do estojo eu preencho o espaço com “painço”. Vamos a mais um intervalo cultural? Em algumas recargas pode ocorrer que sobre um espaço entre a pólvora e a base do projétil. Dependendo do tamanho do estojo esse ‘espaço’ pode aumentar, drasticamente, a pressão. Como nossa recarga é fundamentada em segurança, deve-se preencher, esse “espaço vago” com paina ou painço. Para maior compreensão leia artigo do Dr. Creso na Magnum nº77, página 18.

Com o rufar dos tambores, cronógrafo na linha de tiro, carrego o fuzil e... Deixa baixar um pouco essa fumaça branca que se formou à frente da arma! Tento visualizar, o número que aparece no visor do cronógrafo é... 9...5...0. A velocidade é de 950 pés por segundo. Um belo tiro se fosse com uma pistola Colt 45, sem a grande nuvem de fumaça, é claro. A primeira impressão começa a passar pela cabeça. Não deu tranco, “nê”? E olha que o peso do projétil não é dos menores. 375 ‘grains’. Um belo tijolo voador! Abro a câmara da arma, tiro o estojo e procuro identificar, olhando para a base do cartucho, ao redor da espoleta, se houve excesso de pressão. Se a espoleta estiver com as bordas arredondadas, está normal, se está “chapada” seja cauteloso, é sinal de excesso de pressão.
Novo tiro, nova carga, agora com 55 ‘grains’. Sento na cadeira, faço pontaria no alvo a 50 metros. Apoiando o fuzil nos sacos de areia, cubro a frente do cronógrafo. No primeiro tiro segurei a arma na altura da cintura, com o rosto o mais distante possível da arma. Isso é normal se não conhecemos o “tranco” do primeiro tiro. No próximo tiro, já estou mais relaxado e quase senhor da situação. Lá vai! Muita fumaça branca! Deixa baixar um pouco e, já dá para enxergar, o número é... 1...1...0...5. Sim, 1.105 f/s (pés por segundo). Manejo a alavanca para extrair o estojo deflagrado que pula para fora tão logo abro a culatra. Verifico, novamente, a base do estojo. Agora, a espoleta está um pouco menos arredonda mas dentro dos parâmetros de segurança. O alvo, lá nos 50 metros, marca o resultado do meu tiro. Um “x”. Um “x”? Lembrando que a visada foi na base do círculo preto, o tiro não está ‘tenso’. Imediatamente abro um sorriso. A cara suja de fuligem, a mão também suja por segurar a cápsula e, um grande sorriso de satisfação.
A carga, agora, é com 65 ‘grains’. Mirei, respirei vagarosamente e, lá vai! Baixa a fumaça e o número é 1.185 f/s (pés por segundo). Esse tiro o meu ombro sentiu. Tiro de “macho”, termo usado pelos caboclos do mato. A adrenalina já tomou conta do pedaço. Não sou só eu que estou rindo a toa. Meu amigo ao meu lado, com o rosto sujo de carvão, fica repetindo: “É a primeira vez que vejo um tiro de COMBLAIN que T...(bárbaro?, legal?, fantástico?)”. O que, realmente, vale nesta experiência é reproduzirmos, com segurança, um fato com mais de 110 anos. O cheiro da fumaça, a densa brancura, a fuligem que cobre a nossa mão após cada tiro. Tudo isso é uma verdadeira viagem ao passado, sem necessidade de grandes investimentos, só a imaginação.
As fotos dos alvos demonstram que o COMBLAIN faz um agrupamento, para lá de razoável, a uma distância de 50 metros, para uma arma, essencialmente, militar. Porém, essa é outra estória que fica para uma próxima vez...Até mais...

Fonte de dados:
Jornal Armaria nº3;
http://br.geocities.com/armas_Brasil/secXiX/declínio/armasfogo/comblain_mod...
The Handloader’s – Manual of Cartridge Convertions John J. Donnelly & Bryce Towsley;
Grande Sertão: Veredas – João Guimarães Rosas.

FICHA TÉCNICA COMBLAIN
Modelo Nº 04 ou M85 Características fornecidas pelo fabricante.
calibre: 11x50mm
Comprimento: 121 cm
Peso: 4,28 kg; 9.43 l
Raias: 4 à direita
Alcance útil: 500m; 1.640f
Alça de mira: de 300 a 1.200m
Cadência de fogo:(útil) 8 tiros por min.
Cadência de fogo:(Max) 16 tiros por min.
Velocidade inicial: 420 m/s; 1.378 f/s


“Paper Patch”
Em qualquer segmento que você trabalhe, sempre estamos aprendendo. No tiro não é diferente. No caso do fuzil COMBLAIN quando medi o diâmetro do cano, encontrei o valor de 0,448” e o do projétil 0,430”. Uma senhora diferença de 0,018” (4,6 mm). Na minha cabeça, isso significa, o fato de acertar ou não, o alvo. Ainda bem que era só na minha cabeça. Na realidade, em conversa com os “entendidos”, quando se atira com pólvora negra cria-se uma camada de fuligem entre o projétil e a raia que “acompanha” o tiro pelo cano. Verifique, você mesmo o resultado, nas fotos em anexo.
Aonde entra o aprendizado? Na orientação de fazer o “paper patch” caso o projétil não siga a direção que eu deseje. Tomei conhecimento dessa “arte” e, aqui passo a receita. Corte o papel “craft” no formato de triangulo de tal forma que complete duas voltas no projétil. Umedeça e enrole no projétil esse triângulo, de preferência, em cima de uma toalha emborrachada. Quando estiver bem firme passe, nas pontas dos dedos, uma camada de óleo ou graxa. Aperte, em torno do projétil. Ponha para secar ao sol. Depois de seco, o projétil ficará com uma película de papel “craft”. Na recarga, abra a boca do estojo um pouco mais e assente o projétil, normalmente. Não se esqueça isso só funciona no caso de carregar com pólvora negra. Não use em pólvora sem fumaça.

“Antonio Conselheiro”
Antônio Vicente Mendes Maciel, filho de Quixeramobim, Ceará. Nasceu em 13 de março de 1830 e morto no dia 22 de setembro de 1897 em Canudos, Bahia. Estudou aritmética, português, geografia, francês e latim. Foi escrivão de cartório, encarregado de encaminhar petições ao poder Judiciário e rábula (advogado sem diploma). Perambulou pelo interior do Ceará e outros de estados Nordestinos lendo a “bíblia” e dando sugestões às pessoas até adquirir o apelido de “Conselheiro”. Foi no ano de 1874 que fundou o arraial de Bom Jesus no sertão da Bahia. Em 1893, Antonio Conselheiro se instala em uma fazenda abandonada às margens do rio Vaza-Barris, no norte da Bahia conhecida como Canudos.